TEMA: O ÚLTIMO
DISCURSO (de "O Grande Ditador" de Charlis Chaplin)
Este texto teve sua estréia em Nova York no dia 15 de
outubro de 1940, dito por Adenoid Hynkel (uma sátira a Adolf Hitler), em uma
maravilhosa cena do filme "O Grande Ditador" (The Great Dictator), com Charles
Chaplin. No final daquele ano, a Associação de Críticos de Cinema de Nova York o
elegeu como melhor ator.
Este discurso, chamado de “o último”, serve, e vai servir
sempre, de reflexão para aqueles que acreditam na solução pela guerra.
Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador.
Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja.
Gostaria de ajudar - se possível - judeus, o gentio ... negros ... brancos.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos
viver para a felicidade do próximo - não para o seu infortúnio. Por que havemos
de odiar ou desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra,
que é boa e rica, pode prover todas as nossas necessidades.
O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A
cobiça envenenou a alma do homem ... levantou no mundo as muralhas do ódio ... e
tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos
a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina,
que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos
fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em
demasia e sentimos bem pouco. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade.
Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas duas
virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.
A aviação e o rádio aproximaram-se muito mais. A próxima natureza dessas coisas
é um apelo eloqüente à bondade do homem ... um apelo à fraternidade universal
... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhões de
pessoas pelo mundo afora ... milhões de desesperados, homens, mulheres,
criancinhas ... vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera
inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo: "Não desespereis!" A desgraça que tem
caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia ... da amargura
de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam
desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de
retornar ao povo. E assim, enquanto morrem os homens, a liberdade nunca
perecerá.
Soldados! Não vos entregueis a esses brutais ... que vos desprezam ... que vos
escravizam ... que arregimentam as vossas vidas ... que ditam os vossos atos, as
vossas idéias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que
vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como um gado humano e que
vos utilizam como carne para canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com
o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem
amar ... os que não se fazem amar e os inumanos.
Soldados! Não batalheis pela escravidão! lutai pela liberdade! No décimo sétimo
capítulo de São Lucas é escrito que o Reino de Deus está dentro do homem - não
de um só homem ou um grupo de homens, mas dos homens todos! Estás em vós! Vós, o
povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade!
Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela ... de fazê-la uma
aventura maravilhosa. Portanto - em nome da democracia - usemos desse poder,
unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo ... um mundo bom que a todos
assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.
É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só
mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores
liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater
as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos
por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à
ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos.
Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontres, levanta os olhos! Vês, Hannah? O
sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz!
Vamos entrando num mundo novo - um mundo melhor, em que os homens estarão acima
da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergues os olhos, Hannah! A alma do homem
ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da
esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!