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                                                                             1932 E HOJE: A GANÂNCIA POLÍTICA PELO PODER

                                                                                              Antonio de Andrade *

    Muitos foram os que lutaram e morreram em 1932 por ideais de um Brasil melhor e a volta de respeito às Leis, em especial a volta de um Brasil com Constituição, suspensa pela Revolução de 1930. A Revolução Constitucionalista de 1932 feita pelos paulistas contra o governo provisório de Getulio Vargas, foi o maior conflito armado do Brasil no século XX.

    Falar de 1932 é falar de Getulio Vargas. Mas quem foi esse personagem político que dominou o Brasil entre 1930 a 1954? Os livros de História consideram-no como um estadista, pelas implantações de melhorias no Brasil, como a C.L.T. (Consolidação das Leis do Trabalho) e sua estabilidade no emprego depois de 10 anos de serviço, descanso semanal, regulamentação do trabalho dos menores, da mulher e do trabalho noturno, a criação da Previdência Social, a instituição da Carteira Profissional, a jornada de trabalho de 8 horas. Além desses aspectos, ele criou a Petrobrás e a Cia Siderúrgica Nacional, e incentivou o desenvolvimento industrial do país. Algumas mudanças muito positivas para a população, apesar de Getulio Vargas ter feito muitas delas com o objetivo político de controlar as massas operárias e os sindicatos, usando esses controles para a sua "luta pelo poder".

    Quando se examina os fatos históricos em torno de Getulio Vargas, constata-se que apesar de considerado um estadista, ele teve atitudes muito danosas ao país, em especial as atitudes de ganância pelo poder e a soberba, esta o levando a julgar-se acima de tudo e até das Leis, agindo como um ditador, atitudes que influenciaram grande parte dos acontecimentos nacionais. A ganância pelo poder é uma atitude que pode ser inferida dos comportamentos dele e de outros políticos de sua época, e muito provavelmente, em muitos políticos da atualidade.

    Muitos fatos históricos negativos do Brasil, como a revolução ocorrida em 1932, poderiam ter sido evitados, se os políticos tivessem tido outras atitudes, um pouco mais de espírito público e patriótico, bastante altruísmo e menos egoísmo, e não tivessem tanta ganância pelo poder. Quando se examina o desenrolar dos fatos históricos é que se percebe essa realidade, aspecto que os livros de História geralmente não apresentam claramente. E ao se examinar os políticos do passado, poder-se-á ter condições de comparar com os atuais políticos do cenário nacional... A ganância pelo poder aparece nas atitudes de algum político da atualidade? Ou os políticos têm real interesse em lutar para o bem do povo e do país, candidatando-se com sadias intenções? As lições do passado podem trazer alguma luz para o presente...

    A "luta pelo poder" no cenário nacional, pode ter sido iniciada quando se estabeleceram as regras da alternância do poder presidencial, feito por aqueles políticos que se achavam os "donos do poder". Eram pessoas e grupos que estabeleceram um equilíbrio político entre eles, desde a época do Império, para dominarem o país, em especial através do cargo de presidente e de todos os outros poderes que dele emanavam. Era a tradicional "Política do Café com Leite", onde os dois Estados com maior força política e econômica da época, São Paulo e Minas Gerais, alternavam entre si o domínio do país através da presidência. Os outros Estados, também com poder, como Rio Grande do Sul e a Bahia, por exemplo, contentavam-se com a vice-presidência. E assim, somente quando os dois Estados "donos do poder" não se entendiam, a presidência era assumida por outro, como foi o caso do paraibano Epitácio Pessoa, em 1919, presidente eleito entre o paulista Rodrigues Alves e o mineiro Artur Bernardes.

    Essa luta pelo poder ficou mais explícita em 1929, o último ano de governo do presidente Washington Luiz Pereira de Souza. Apesar do presidente ter nascido em Macaé, RJ, ele era considerado paulista pois toda a sua carreira política tinha sido feita em São Paulo. Pelas regras políticas tinha chegado a vez de Minas Gerais assumir a presidência, com seu governador Antonio Carlos, ser indicado como candidato do governo. Washington Luiz tinha imposto moralidade administrativa no governo e conseguido diminuir a dívida externa, fazendo riquezas circularem pelas novas estradas recém-construídas e valorizando a moeda do país. Mas havia muitos que não estavam gostando do que o presidente fazia, e se uniram contra o seu governo, criando em agosto de 1929 a Aliança Liberal. Essa Aliança era uma força de oposição, reunindo os insatisfeitos com o governo, da área política, militar, radicais, moderados, classe média, industriais, etc. Essa oposição era comandada, em especial, pelos governadores Getulio Vargas, do Rio Grande do Sul, Antonio Carlos de Minas Gerais e João Pessoa, da Paraíba. O presidente Washington Luiz queria continuar os planos do seu governo com as ações de melhoria do país e, por isso, quebrou as regras da "Política do Café com Leite", colocando como candidato do governo, Júlio Prestes, governador de São Paulo. Naquela época, o candidato oficial sempre vencia, era impossível vencê-lo, pois o governo controlava as eleições.

    A ambição de poder do governador mineiro, Antonio Carlos o levava a não abrir mão da sua vez de assumir o poder presidencial. Não sendo possível, pelo menos teria que ser alguém do seu grupo de poder. Pronto, estava lançada a candidatura de Getulio Vargas. Se o governador mineiro tivesse deixado o seu Ego de lado, com a ambição e a ganância pelo poder, e tivesse olhado o bem do país, com a continuação das ações que estavam trazendo grandes progressos ao Brasil, não teria ocorrido a Revolução de 1930, com a destituição do presidente, e teriam sido evitados os desmandos do governo provisório de Getulio Vargas e os paulistas não teriam pego em armas para fazer o país voltar ao normal, regido por uma Constituição. 

    Mas, as ambições de domínio político, e ânsia pelo poder, não foram deixadas de lado. Ao contrário, fizeram com que os políticos opositores ao governo, do partido Aliança Liberal, recusassem a aceitar os resultados e a validade das eleições de março de 1930, afirmando que a vitória de Júlio Prestes tinha sido por fraude. Ninguém agia pela razão, mas pelas emoções, com certeza motivados pela ganância pelo poder, a vontade de ter mais poder! E assim, em 3 de outubro de 1930 explodia no Rio Grande do Sul um movimento militar contra o presidente. O candidato derrotado nas urnas tinha recebido 737 mil votos e Julio Prestes tinha recebido um milhão e cem votos). Getulio Vargas assumiu o comando militar dos revolucionários, partindo dia 10 em direção à capital federal, o Rio de Janeiro. Tropas federais entrincheiraram-se em Itararé, na fronteira de S.Paulo com o Paraná, aguardando o trem com os revoltosos. Era para ter sido a Batalha de Itararé, mas ela não aconteceu porque antes do embate armado, o presidente Washington Luiz foi destituído por três generais, em seu gabinete do Palácio do Catete, em 24 de outubro e partiu para o exílio na Europa. Em 3 de novembro, os generais passaram o poder para Getulio Vargas, presidente de um governo provisório.

    Mas Getulio Vargas e os que o apoiaram, em vez de terem atitudes equilibradas como políticos e novos administradores do país, realizando ações para o bem coletivo, começaram a mostrar, com suas atitudes, que estavam cheios de vaidade, muito orgulho, com uma superestimação dos próprios méritos e feitos, com desprezo dos demais. Logo de início, as pessoas conscientes já perceberam que o movimento revolucionário comandado por Getulio era uma catástrofe para o país, pois os aventureiros eram incentivados, havendo uma decepção geral naqueles que tinham sadias intenções patrióticas. Getulio Vargas, com atitudes de soberba,julgando-se acima de todos os demais, um aspecto que o caracterizava, desprezou o programa elaborado pelo Partido da Aliança Liberal, que o apoiara, programa de governo que ficou como letra morta. Partido e programas para o desenvolvimento do país, nada significavam para ele. A sua ganância pelo poder tinha predominado...

    Getulio assumia o poder fazendo morrer a República Velha e tirando o poder do Partido Republicano, que até então era o dono do poder. E nascia a República Nova, nascida da força das decisões dos generais e pela força das tropas que envergaram o uniforme rebelde, com lenço vermelho e chapéu gaúcho. E nascia, em especial, pela força da ambição política e ganância pelo poder, que Getulio tinha. A soberba e ambição dele o levaram a assumir o país como ditador, suspendendo a Constituição que vigorava desde 1891, dissolvendo o Congresso Nacional, demitindo todos os que tinham algum poder nas cidades e nos Estados e nomeando interventores em seus lugares. Achando-se "dono do país", assumiu poderes ilimitados, insatisfazendo muitos brasileiros, em especial os paulistas.

    O Estado de S.Paulo era um dos dois Estados "donos do poder", até então. E a oligarquia dominante (políticos e os fazendeiros da aristocracia do café, junto com a emergente classe dos industriais) que antes detinha o poder sobre São Paulo e sobre o Brasil, não gostou, é claro, de ter seu poder diminuído e estar sendo mandada pelos novos donos do poder, em especial pelos interventores do Getulio nas cidades e no Estado paulista, além de outros Estados. Essa oligarquia queria, por todos os meios, assumir novamente o poder que tinha perdido. E escolheu o caminho da luta armada, já que outros meios utilizados não davam resultado com Getulio Vargas. O povo foi despertado para lutar contra os desmandos de Getulio e seus interventores. O lema da Constitucionalização com a volta á legalidade, foi transformado na bandeira que levantou o povo paulista para lutar, com armas, contra o governo provisório de Getulio Vargas.

    Deixando de lado os ideais paulistas de um país que tivesse o respeito às Leis, com Constituição, mais autodeterminação e liberdade, e examinando-se a Revolução de 1932 por essa ótica da luta por poder, verifica-se que foi uma luta de "donos do poder" contra os novos "donos do poder". E assim, estourou em 9 de julho de 1932 a revolta paulista e essa luta armada durou três meses, encerrando-se a 2 de outubro com a assinatura da rendição pelos comandantes da Força Pública, em Cruzeiro, SP. Nessa rendição não estava a assinatura do Coronel Euclides Figueiredo, comandante das tropas paulistas, que não aceitou os termos estabelecidos pelo general Góes Monteiro. O poder do Getulio havia vencido os paulistas.

    Após o término do confronto armado de 1932, Getulio Vargas continuou a mostrar a sua ganância por poder, governando o Brasil, por decretos, até 1934. Com a eleição da Assembléia Constituinte em 5 de maio de 1933, o Congresso recém-eleito aprovou a segunda Constituição da República em 16 de julho de 1934 e, numa eleição indireta, elegeu Getulio Vargas para o cargo de presidente, com um mandato de mais quatro anos, até 1938. Dois partidos surgiram no cenário nacional, a Aliança Nacional Libertadora, de orientação esquerdista e a Ação Integralista Brasileira, de orientação nazi-fascista. O primeiro foi considerado fora da Lei em 1935 e os militares identificados com esse Partido, iniciaram em novembro o movimento chamado de Intentona Comunista, logo dominado por Getulio. Ele queria permanecer no poder e forjou o Plano Cohen, um plano inventado para agitar a opinião pública, pondo a culpa nos comunistas, que segundo ele queriam lançar o país a uma guerra civil. Getulio fez isso para ter o pretexto para dar um golpe de Estado no dia 10 de novembro de 1937, às vésperas da nova eleição presidencial, fechar o Congresso e anunciar uma nova Constituição, inspirada na do regime autoritário da Polônia, logo chamada de "A Polaca". 

    Esse golpe de Estado mostrava que Vargas tinha muita vontade de se perpetuar no poder! Era tanta essa vontade que as más línguas da época contavam uma anedota que dizia que Getulio tinha mandado um emissário à Palestina (local onde mais tarde foi criado o Estado de Israel), para indagar quanto custaria para ele ser enterrado no Santo Sepulcro, quando morresse. Achando o preço elevado, ele mandou indagar quanto seria o aluguel por apenas 3 dias, já que ele pretendia ressuscitar para continuar no poder...

    Com o golpe de 1937, era iniciado o Estado Novo. Vargas extinguiu os partidos políticos e manteve o poder em um regime ditatorial até 1945. O êxito da democracia nos campos da Europa,na Segunda Guerra Mundial, forçou Getulio a mudar um pouco o seu estilo de governo. Assim, diminuiu um pouco a sua soberba e ganância pelo poder e fez, em 1945, o Ato Adicional à Constituição, marcando eleições presidenciais e uma nova Assembléia Constituinte para o Brasil. Três partidos políticos surgiram, o PTB - Partido Trabalhista Brasileiro, inspirado por Vargas, a UDN - União Democrática Nacional, contrária a Vargas e o PSD - Partido Social Democrático. Mas as forças militares não confiavam mais em Getulio Vargas, pelas atitudes que ele já tinha mostrado antes, desconfiando dessas suas "boas intenções". Em 29 de outubro de 1945, tropas do Exército cercaram o palácio presidencial, o Catete, comandas pelo ministro da Guerra, General Góes Monteiro, o mesmo que assinou com a Força Pública o armistício em 2 de outubro de 1932. Góes Monteiro fez, então, o que os paulistas não conseguiram fazer em 1932: destituiu Getulio Vargas da presidência.

    Nas eleições presidenciais de dezembro de 1945, foi vencedor o General Eurico Gaspar Dutra. Mas a ânsia pelo poder de Vargas não tinha diminuído com o exílio em sua fazenda de São Borja, RS. Nessa eleição ele se candidatou e foi eleito senador e em 1950, novamente se candidatou para presidente pelo seu partido o PTB. Foi eleito e continuou no novo mandato presidencial com suas atitudes de "dono do mundo", dominando tudo e a todos. Só que dessa vez enfrentou acirrada oposição, liderada pelo jornal A Tribuna da Imprensa, de Carlos Lacerda. Em 5 de agosto de 1954 a guarda pessoal de Getulio Vargas fez um atentado contra Carlos Lacerda,  assassinando o major da Aeronáutica, Rubens Vaz, que o acompanhava. Grave crise política aconteceu após esse atentado, alimentada por escândalos administrativos e elevados índices de inflação. Exigia-se a renúncia do presidente e Getulio sentiu-se isolado, sem o apoio dos militares que também desejavam retirá-lo novamente da presidência.

    Mas, a soberba de Getulio era demais, não admitia ficar por baixo, queria continuar a ser venerado como alguém superior. E assim redigiu a sua Carta Testamento, revelando suas atitudes nas palavras deixadas escritas, antes de cometer o suicídio, com um tiro de revólver no coração, na madrugada de 24 de agosto de 1954:... "Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte... Saio da vida para entrar na História."   

    Se Getulio Vargas não tivesse tido tanta ganância pelo poder, a História do Brasil teria sido escrita de outro modo. Não teria ocorrido a Revolução de 1932 e outros fatos históricos. Trazendo essas experiências históricas para a atualidade, fica-se com uma pergunta. E hoje, existem muitos políticos cuja motivação para os cargos nos governos municipais, Estaduais e Federal está na ganância pelo poder? Faça a sua análise, prezado/a leitor/a e tire suas próprias conclusões...


* Leia mais sobre 1932, nos outros artigos de Antonio de Andrade, artigos disponíveis no site www.editora-opcao.com.br, juntamente com os Livros e Cursos para empresas, desse escritor. Caso deseje aprofundar-se no assunto 1932 há o livro do autor, encontrado pelo site, para ler em seu computador, texto e imagens, pelo link www.editora-opcao.com.br/ada69.htm,  Esse livro "1932 - Os deuses estavam com sede" no formato impresso está com a edição esgotada mas pode ser também encontrado no formato E-book na Amazon.