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ARTIGO DA SEÇÃO "Reportagem"
JORNAL CARREIRA & SUCESSO - 17 de setembro de 2001 - 98ª. EDIÇÃO

  SIMPLIFIQUE A SUA VIDA 

...e libere tempo para fazer o que mais gosta

Por Cristina Azevedo
(da revista Seleções)


Há cerca de dois anos, a advogada Gratiela Folly Rodrigues Barreto, do Rio de Janeiro - RJ, percebeu que estava acordando cada vez mais cedo e dormindo cada vez mais tarde para dar conta de todas as tarefas diárias. A esposa, mãe e funcionária do Tribunal Regional do Trabalho cumpria suas responsabilidades, mas faltava tempo para fazer o que para ela era mais importante.


Ela e o marido, o arquiteto José Lindemberg, começaram a buscar meios de simplificar suas vidas. "Tivemos que decidir o que era realmente importante", diz Gratiela. Eles sabiam que precisavam de mais tempo com as filhas Natália, 11 anos, Júlia, 8, e Mayla, 5, além de fazer exercícios físicos, alimentar-se corretamente e estabelecer amizades.


Então, o casal decidiu viver mais modestamente: ao voltar ao trabalho depois da quarta gravidez, ela abriu mão da função de assistente-secretária do juiz que exercia no tribunal, tornando-se assessora administrativa do juiz. Dessa forma, passaria a trabalhar em casa. Embora a decisão significasse uma queda de 30% a 40% no salário – e um orçamento mais apertado –, Gratiela pôde reduzir o ritmo de atividades. As filhas não precisariam mais de cursos extracurriculares para preencher o dia, o casal teria mais tempo juntos e Gratiela poderia desenvolver uma atividade física. O marido também ficou menos sobrecarregado, pois não precisaria mais pegar as meninas na escola.

"Ainda sou dedicada ao meu trabalho, mas hoje me alimento melhor e minha saúde melhorou. Não tenho mais pressão alta, cansaço ou dores de cabeça. Minha vida está mais simplificada. Por ser capaz de controlar meus horários, tenho tempo livre e posso comparecer às festas escolares, onde antes minha mãe me representava. Vejo que minhas filhas choram menos. Agora conheço as mães de seus colegas e, se for preciso, uma delas pode buscar as meninas no colégio. Definitivamente, minha família ganhou muito com essa mudança."

De acordo com estudos recentes, a família Barreto não está sozinha na procura por um ritmo mais lento e uma vida mais satisfatória. Uma pesquisa do professor Esdras Guerreiro Vasconcellos, do Instituto de Psicologia da USP e do Instituto Paulista de Stress, Psicossomática e Psiconeuroimunologia, realizada com mais de 1.500 pessoas em todo o Brasil, mostra que 92,4% delas se queixam da falta de tempo para fazer o que desejam.


Para onde o tempo vai? Para a maioria das pessoas, o trabalho e o deslocamento entre a casa e o emprego dominam o dia. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando você é empregador, trabalha, em geral, 49 horas por semana. Já os empregados destinam 42 horas semanais ao desempenho de suas funções. E os que trabalham por conta própria, dedicam 38 horas aos afazeres profissionais. A isso se soma uma hora e meia gasta diariamente no trânsito, no Rio de Janeiro - RJ ou em São Paulo- SP, e cerca de uma hora em capitais como Fortaleza - CE, Belo Horizonte - MG, Salvador - BA e Recife - PE.

Aí está a grande questão da vida moderna: muitas informações para examinar, muitos produtos para comprar. "Precisamos parar de nos preocupar com o ter e pensar mais no ser", propõe o escritor Antonio de Andrade, autor de Criança feliz, adulto feliz: o poder emocional da autoimagem, livro que prega a simplicidade voluntária.
(Livro encontrado no formato impresso no site www.editora-opcao.com.br e no formato E-Book na Amazon)

Simplificar significa estar atento às maneiras, pequenas ou grandes, de como gastamos dinheiro, tempo e energia e, então, estabelecer medidas para controlar o desperdício. Aqui estão algumas sugestões dos especialistas para ajudar a ganhar o controle sobre os aborrecimentos da vida de forma a ter tempo para os prazeres.


1. Comece bem o dia
Antes de aplicar a regra, as manhãs eram um pesadelo para a enfermeira de Natal - RN, Aura Helena Gomes Dantas de Araújo (mãe de Aldair Júnior, 14 anos, Ana Júlia, 12 e Arthur, 11) e o marido. "Tínhamos que sair de casa todos os dias às 6h30. Quase sempre um livro ou trabalho era esquecido, ou ainda a lancheira ou a toalha da natação. Era preciso, então, voltar. Chegávamos atrasados e as crianças rendiam menos na escola. Quando a aflição acabava, estávamos todos de mau humor. Foi preciso mudar nossos hábitos."
A regra dos Araújos?


Na noite anterior, preparar tudo que for possível para o dia seguinte. Os filhos guardam na mochila o material escolar. Os uniformes e as roupas também são separados na véspera, quando é possível ver se falta algum botão ou se é necessário passar as roupas novamente. O pão com manteiga é guardado na geladeira pronto para ir para a torradeira e todos tomam a mesma vitamina ou o mesmo suco.


"Planeje o seu dia ou a sua semana. Comece com uma lista de atividades, organizada em seqüência lógica. Faça um roteiro para as tarefas a serem realizadas na rua. E coloque todas as contas numa pasta, separadas por dia e banco. Assim, nenhuma tarefa será esquecida", sugere o consultor Jorge Bruno, que ministra cursos e palestras sobre administração de tempo.
Deixe tudo que será levado – mochilas, roupas – em frente à porta. Guarde as chaves sempre no mesmo lugar. Estudos americanos mostram que o adulto gasta, em média, 16 horas num ano procurando chaves.


2. Organize a casa
"Quanto mais bens materiais você acumula, mais se torna escravo deles", diz Rosa R. Krausz, autora de Administre bem o seu tempo. "Não é só o trabalho com limpeza e manutenção que conta, mas também o tempo gasto tomando conta dos bens, como quem deixa de viajar com medo de que a casa fique vazia e seja assaltada."


Para derrotar aquela voz interior que diz "Eu posso precisar disso", Antonio de Andrade aconselha: "Pergunte à você mesmo se realmente precisa disso. É necessário mudar os valores e ajustar a vida ao próprio padrão."


Laura Bortolai, dona da Help Home, empresa paulista especializada em organização e manutenção de residências, aconselha os clientes soterrados em escombros – e incapazes de encontrar sequer um parafuso perdido – a começar devagar. "Tudo o que você não usa mais pode fazer a felicidade de alguém. Comece por um cômodo, por exemplo, o quarto. A roupa que não foi usada numa estação provavelmente não será mais vestida. E na cozinha? Se comprou panelas novas, dê as antigas."


Arrume uma gaveta ou prateleira de cada vez. Se está quebrada, conserte-a ou jogue fora. Se não servir, transforme-a ou desfaça-se dela.
Basta o cultivo de um só hábito para evitar a bagunça: não deixe nada num lugar provisoriamente. Não ponha paletós em cadeiras ou copos na pia. Como mamãe dizia, "Não deixe nada espalhado. Guarde tudo." Do contrário, fará o mesmo trabalho mais de uma vez.


3. Diga não gentilmente
Há dois anos, a auditora Marlene Mendes Louro, do Rio de Janeiro - RJ, dividia o seu tempo entre a filha, o emprego na Receita Federal e os trabalhos voluntários no Comitê Centro da Ação da Cidadania do Instituto Palmares de Direitos Humanos e no Lar Flor de Lis, um abrigo para menores de rua.


Seu horário impossível a levou a crises de ansiedade, que a forçaram a priorizar e limitar o trabalho: decidiu aposentar-se, fechou o comitê, delegou tarefas no Flor de Lis e reestruturou o Instituto Palmares, passando a preparar pessoas para o mercado de trabalho. "Hoje vejo mais a minha filha e a ansiedade desapareceu. Tudo está funcionando melhor. Acho que quando atiramos em várias direções, acabamos não acertando em nada."


"Quando você diz sim para alguém, pode estar dizendo não para você mesmo"
, diz Fernando Henrique da Silveira Neto, autor de Ganhe tempo planejando: seu dia pode render mais. "Às vezes, basta dizer não por enquanto."
Diga de forma gentil, mas imediata, dando uma breve explicação, como "Não tenho tempo". Evite entrar em detalhes – ou a pessoa verá um jeito de você atender ao pedido.


4. Não poupe centavos e gaste horas
"Costuma-se dizer que tempo é dinheiro", diz Renato Bernhoeft, autor de Administração do tempo – um recurso para a melhoria da qualidade de vida pessoal e profissional. "Mas o tempo é mais importante, pois ele não pode ser poupado ou recuperado." Vale a pena perambular atrás de uma promoção quando o armazém da esquina tem o que você quer? Esperar pelo prato para viagem quando existe um serviço de entregas em troca de uma pequena gorjeta?
Em vez de afastar a ideia com frases como "Eu não posso pagar", pense duas vezes. Pode valer a pena.


5. Encoraje seus filhos a ajudar
Tania Zgury é educadora com mestrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e autora de Educar sem culpa – a gênese da ética. Sua regra de ouro para as famílias é que os filhos devem participar da vida da casa, pois essa é a primeira sociedade à qual pertencem. Como consequência da sua ajuda nas tarefas domésticas, sobra mais tempo para os pais, inclusive para ficar mais com os filhos.


As crianças de três ou quatro anos podem se despir e se vestir sozinhas, mesmo que os pais precisem orientar na escolha da roupa, abotoá-la ou amarrar os sapatos. Podem também carregar os mantimentos para os adultos guardarem as compras do supermercado. As de cinco a sete anos podem tomar banho sozinhas, ajudar a lavar o carro, arrumar a mochila e cuidar dos animais, inicialmente com a supervisão dos pais. As de oito a 12 anos podem receber semanada para gastos pessoais, limpar o próprio sapato, ajudar os irmãos menores e, dependendo do local onde moram, comprar o jornal.


"Os pais devem ensinar fazendo as tarefas com as crianças como uma brincadeira. Não devem tratar os erros como fracassos. Pelo contrário: devem estimular as vitórias. Se as crianças acharem ruim fazer sempre as mesmas tarefas, pode-se estabelecer um rodízio", aconselha.


Esteja preparado para reduzir as expectativas a princípio – uma cama malfeita é bem melhor do que uma cama desarrumada. Mas se a arrumação da cama estiver patética, talvez se trate de uma sabotagem. "Procure uma estratégia", diz Tânia Zagury. "Se você desistir, o seu filho, tendo saboreado o gostinho de vencer as delegações, poderá usar a mesma tática para se livrar de outras tarefas."


6. Desligue a televisão
De acordo com o Ibope, o brasileiro assiste à televisão, em média, 21 horas por semana. Ela é seu principal lazer. “Entretanto, a televisão não é a melhor forma de entretenimento no tempo livre", diz o sociólogo Luiz Octávio de Lima Camargo, autor de O que é lazer?. Ele sugere diversificar: ler, ouvir música ou desenvolver atividades físicas e artísticas.


Professora do Instituto de Psicologia da UFRJ e terapeuta familiar, Angelina Belli propõe desligar a televisão em determinados momentos, como durante as refeições. "As famílias poderiam reservar pelo menos uma hora por dia para conversar e descobrir outros passatempos."
A recompensa por toda essa simplificação? Mais tempo para fazer o que gosta – brincar com as crianças, dedicar-se à jardinagem ou viajar. Nada poderia ser mais simples.


(Revista Seleções, junho de 1999)
 

 

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